segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Réquiem para Joaquim - Capítulo II

Segue abaixo o segundo capítulo desse pequeno conto que tenho escrito em horários de folga.

Réquiem para Joaquim
Por Alexandre Nicoletti Hedlund

II – “deve-se cuidar com o veneno para não morrer envenenado" 

Na grande tela, em frente à cama, um velho sentado na varanda constatava:

“Mesmo pensando que fazia o bem, ela apenas se machucava.” – Enquanto a menina apenas colhia algumas rosas, machucando-se com os espinhos.

Colombo parecia envolto pela trama, e, deitado ao meu lado, acompanhava as desventuras da bela atriz que interpretava uma jovem cega.

A escuridão do quarto era cortada pelos flashes de imagens que acompanhávamos cada um em seu ritmo. Eu já adormecendo, mas Colombo seguia a tudo vividamente. Aos poucos, meus olhos, enamorados pelas doses de whiskey, perderam outra batalha e o copo caiu ao lado da cama. Mesmo assim, Colombo não perdeu a concentração e garanto que assistiu ao filme até os créditos finais, embora não tenha me contado o que acontecera com a menina.

Muito cedo, eu já estava desperto e os benefícios ficaram evidentes, pois estava bem disposto, cantarolando uma bossa-nova qualquer, enquanto preparava nosso café da manhã. Colombo desceu as escadas preguiçosamente – como era seu costume fazer – e veio até onde eu estava.

 Às vezes, era surpreendido por pensamentos sobre a magnífica contradição presente na minha relação com Colombo, pois não consigo me recordar de um dia que nossos humores estivessem próximos.

Pensando bem, talvez no dia em que Clarice nos deixara fosse possível que ambos estivéssemos tristes. Eu por meus motivos, ele em virtude que Clarice havia levado Guigui, a Yorkshire Terrier que detinha seu coração canino. Ouso pensar que Colombo estivesse mais triste na ocasião, mas são apenas suposições.

De qualquer modo, éramos apenas dois solteirões que curtiam uma tremenda fossa, descrentes do amor e imunes aos venenos da paixão. Isso era algo velado e nunca tocávamos nos nomes de Clarice e Guigui. Lembro que, certa vez, Colombo teve um encontro no parque, mas foi algo superficial, sem grandes envolvimentos. Acho que as coisas para ele eram mais fáceis.

Para mim tudo corria mais vagarosamente, como medida necessária para evitar frustrações e sofrimento. Vez por outra, os amigos mais próximos tentavam apresentar algumas mulheres superinteressantes que, apesar de perfeitas, estavam solteiras. Porém, meu ânimo para tais “aventuras em busca do inexplorado” era no mínimo desestimulante e nunca passava de um primeiro encontro malsucedido em algum restaurante qualquer.

Geralmente eu dava um jeito de levar Colombo junto, como elemento surpresa e perfeita desculpa. Seu auxílio era muito mais que uma participação, aproximando-se de efetiva coautoria para estragar tais. Porém, em um encontro inusitado o desenrolar das situações foi diferente.


Tal fatídico até me fez lembrar aquele velho ditado: 

“deve-se cuidar com o veneno para não morrer envenenado”.

Não conheces? 

Tudo bem, o ditado não existe, mas eu achei que coube ao caso que pretendo contar.

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