quarta-feira, 20 de outubro de 2010

A boca do fogão

A boca do fogão
Por Alexandre Nicoletti Hedlund

Acendeu-se a boca do fogão
E era maior do que chaleira
Fez-me pensar se no inferno
Haveria semelhante caldeira

Com comidas, garfos e pratos
A mesa tão bem disposta
Já não guardava espaço
Para alimentar nossas respostas

Assim se assinalou o porvir
Do cheiro tão forte do café
Do bater de colheres nas xícaras
Na esperança de se ter quem se quer.

Na agonia serena do pão
Que estalava sem muito esfarelar
Sentados frente a frente na mesa
Tivemos a sensação de tudo mudar.

E a boca do fogão não parava
De tudo e a todos aquecer
Mesmo que o coração esfriasse
Naquele escuro e silencioso entardecer

Depositou duas pedras de açúcar
Que afundaram no negro sabor
e a cada sorver envolto à fumaça
no peito reafirmava uma dor

Memórias tão tristes, esquecidas
em tantas histórias inventadas
dando um gosto amargo à vida
tal o suco de laranjas cansadas.

E o amargo café já esfriava
Sem nos permitir muito mais que ilusão
Pois nem o tempo silencia o calor da chama
Que a tudo observa, na boca do fogão.

2 comentários:

  1. isto lembra o frio, mas também a comida sempre quentinha, muito bom o poema, parabéns Alexandre.

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  2. Como muito bem postulou Oswald de Andrade, em seu Manisfesto da Poesia Pau-Brasil, " A poesia existe nos fatos, (...)" assim esta surge de pequenas observações, sensações, em que momentos corriqueiros,rotineiros, ganham vida e transformados em versos, preenchem de cor , luz, emocionam,encantam àqueles que são nutridos de alma e gosto literário.
    Eis, a singularidade do poeta, ver o que todos veem, contudo, possui a capacidade de ir muito além de um simples olhar.
    Parabéns pelos versos!

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