Um sopro de vida para o Senhor Ericson
por Alexandre Nicoletti Hedlund
O Senhor Ericson trabalhara a vida inteira como limpador das válvulas das máquinas da indústria teceleira de Herrman Splitz. Certa noite, o Senhor Ericson, cansado de seu fastidioso labor, chegou em casa e, atravessando o grande corredor que se iniciara na porta de entrada e que o levaria até o lavabo, silenciosamente se sentou diante do espelho.
Seus olhos azuis contrastavam com a sujeira que o envolvia, realçando ainda mais o deplorável estado de seu corpo. Sua velhice precoce e o respirar carregado eram contemplados de forma serene pela imagem no espelho que o fitava.
- Seu velho idiota! Grande velho idiota! - sussurrou para o espelho.
- Não percebe a serenidade que tua vida não contempla? - exclamou.
Não conteve uma gargalhada.
- O que está acontecendo ai, pai? - gritou Mia, sua cansada e sofrida companheira de decepções.
- Nada, me deixe com meus fantasmas. - respondeu o Senhor Ericson.
Pegou suas mãos sujas e passando-as no rosto, percebeu que a sujeira se espalhava de lado a lado. Sentiu-se mais nojento, um ser desprezível em sua própria essência.
- O que esperava de ti? O que esperava de mim? - balbuciou, sem levantar o rosto.
- Está falando com quem, homem? - gritou Mia, raspando uma colher na panela ao fogo.
E nesse momento o Senhor Ericson sentiu um sopro de vida, fulminando seu coração, enquanto ele caia ao lado da pia que Mia limpara a alguns minutos.
O Senhor Ericson recebeu flores de Herrman que não pode lhe saudar em seu funeral, pois na indústria, contratava-se outro limpador de válvulas.